2022-01-12

 elogio do tabaco

DELITESCENTE Delitescens é uma bela palavra latina que significa esconder e em meio a tanto barulho e gritos muitos de nós não temos escolha a não ser nos encontrarmos. Fugimos para o deserto em busca de um apartamento que nos afastasse da horda da mídia. Os falantes de éter continuam se referindo ao vírus Corona. Tornou-se o farelo e a calha da mídia. Não faço essa cataênfase ou afirmação para fumar de canudo, nem sou louco, embora às vezes olhe para trás com raiva e sinta a picada das lembranças que me machucam. Minha alma está crua e é por isso que escrevo deste catálogo ou bloco no porão de minha casa transformado em oratório, sala de fumo, escrivaninha, biblioteca e apiário (apiário) onde bebo a doçura do sótão do mel da palavra. Tudo o que já não serve para nada é do meu agrado. Dizem que sou um homem que vive no ontem e me refugio nas matanças do velho muro de York sentinela em meu vão ouvindo a evolução do rio Ouse que flui até se casar com o Tâmisa, os ventos mudam. Ontem tivemos leite, hoje o terral sopra e você, Etsi, onde estará? O que foi feito da sua vida? Você casou? como eu. E eu passei pelo vicariato novamente. Em mau momento porque minha segunda esposa se tornou minha carrasca. Tornou-se a raiz que açoitou minhas costas com o chicote da ignomínia e tenho remado os sete mares sob a sombra desse chicote que açoita os pobres comedores incautos condenados a galés. É o destino que aguarda os loucos e criminosos. Lamento minha sorte porque longe de você isso não é vida. O destino foi cruel comigo, embora eu ache que mereço por causa dos maus tratos que dei a você, dos ciúmes, das vozes, das recriminações. Vivo cercado de papéis e de palavras escritas. Eu era guloso pelas palavras porque acredito firmemente no axioma de que no princípio era o Verbo e as palavras guardam um pouco desse sopro divino. Estou louco perdido? Todos eles trocaram de pele (versipelis) e eu continuo a aderir aos meus princípios. Sou um diamante bruto ou uma flor vermelha verde? Tranquilo. O peristilo ainda está em sua bainha. Amanhece todos os dias. Meu clamor contra os pregadores de calçada é dirigido a tudo isso. Os emuli de Frei Gerúndio de Campazas voltaram às reuniões. Eles não falam mais da vida eterna, mas dos métodos para manter a saúde. A Rádio Carcamal grita contra as toxinas e Don Rafa faz da sua capa uma túnica gritando contra os perigos do cancro, da grosseria, do sedentarismo e da falta de exercício. O país inteiro calça as sandálias e corre pelas calçadas. Uma enxurrada de informações nos fala sobre os perigos da Covid, que se tornou o eixo do sistema. As páginas da Internet são um obituário perpétuo que nos traz a lista dos falecidos todas as manhãs. Na contramão de seus sermões, não vou parar de fumar, por mais que esses senhores trovejam em minhas meninges, me alertando sobre os perigos do tabaco, sempre haverá um inimigo em perspectiva, alguém contra quem lutar. Uma vez foram os russos. Quando eu morava na Ilha dos Mortos (Staten Island), eu estava sempre no local de trabalho ouvindo as notícias de uma estação de rádio de Manhattan WW700W7. Esta estação de tempos em tempos interrompeu suas transmissões. Uma sirene soou e no final a voz encapuzada de um locutor saiu para fazer uma chamada: "Caros ouvintes, este é um alerta de treinamento." Atenção. Atenção. Se fosse uma emergência real, daríamos instruções sobre como e onde se dirigir a um dos diferentes abrigos desta ilha. Eu estava com medo de sintonizar uma mensagem dessas. Eu estava pensando na guerra dos mundos. Já estão aqui. Os russos estão chegando. Como na Guerra dos Mundos de Wells que fez essa capital entrar em pânico. Pensava que vivemos em um mundo em que a ficção se confunde com a realidade e na supremacia dos meios de comunicação de massa para dominar as massas. Era o discípulo americano de Jimmy Carter na academia de guerra do Almirante Rickover em Annapolis, especializado em ICMs. Eram os anos 70, quando a América estava experimentando a efervescência de Star Wars. Os bandidos eram os soviéticos como agora é o vírus e o tabaco, Ronaldo Reagan venceu e determinaria a queda da URSS. De minha parte, pobrezinho espanhol nascido numa cidade provinciana, uma cidade episcopal como York desembarcou na Big Apple desde a Idade Média, o empório do futuro, a cidade automática que Julio Camba costumava dizer. Ele não era nada mais do que um lambedor de ruínas viajando do humanismo católico sentimental para a tecnologia de design legal dos novos mestres do mundo. Eu peguei o jeito. Custou-me o meu mas aquela mensagem da rádio de Manhattan que transmite notícias 24 horas por dia para a cidade que não dorme e pousa como podes, marcou a minha existência,

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